25 de fevereiro de 2016

Em português (muito) suave


No outro dia, um casal almoçava na mesa do lado. Meteram conversa e falaram dos filhos, «passam as refeições a olhar para a televisão e a teclar no iphone». Continuei a ouvir o queixume, «perdemos o controle à situação, não sabemos o que vai dentro daquelas cabeças.» Às tantas, e porque não desejei que ficassem com a ideia que falavam para um confessionário, argumentei, «uma das gatas que tenho em casa, - a mais jovem, todos as noites brinca comigo, pelo menos 30m. Jogamos à bola, ela abraça-me os braços e as mãos, comunicamos....fazemos daquilo um ritual» e a dupla de comensais foi ouvindo. Voltaram à carga com uma batalha perdida, «a educação dos filhos, a falta de tempo, a ausência de comunicação». Quando a partilha da mesa e converseta era interrompida com garfadas e degustação de um copo de vinho fui dizendo, «a questão é antiga, nós consentimos que as escolas, a televisão, o regime, viva sem a revolta do cidadão, ou seja - vivemos sem jornais, na ausência de uma educação para a cultura. A música, o velho Cinema, as histórias das religiões, a pintura, o hábito de ouvir os mais velhos, foi-se perdendo, consentidamente, somos impingidos.» Os meus parceiros de faca e garfo, acharam que a conversa derivara para a política, eles apenas, «queriam falar de um estranho vazio.» Na chegada do café e das despedidas, pediram desculpa por me tomarem tanto tempo de conversa, «ainda por cima ao almoço». Despedi-me dizendo o que por vezes digo, «Ser quase dono do tempo, é excelente».